terça-feira, 29 de maio de 2012

Aulas de Português no Ensino Médio

Ivana Patrícia Pereira Silva

Durante as aulas de Morfologia com a professora Tânia, na turma “A” da Faculdade de Letras/UFG, surgiu um debate sobre as formas de expressão do acusativo. Nesse debate, chegamos à conclusão de que seria importante realizar um estudo para analisar o conhecimento de alunos de nível médio sobre esse assunto.
Como eu era a única professora que estava atuando em sala de aula da educação básica, fui democraticamente escolhida para realizar esse trabalho, no qual contei com a colaboração de alguns colegas, em especial a Fernanda Carolina, que propôs a discussão em sala e me forneceu material sobre o assunto abordado para desenvolvimento das aulas-pesquisa.
A escola em que eu trabalho, onde foi realizada a pesquisa, se encontra em Aparecida de Goiânia, mais especificamente no Garavelo. Trata-se de uma escola pública estadual. No período noturno, há quatro salas: um primeiro ano, um segundo e dois terceiros, cada sala, na época da pesquisa, tinha em média quarenta alunos, cuja faixa etária varia entre 16 e 50 anos (a maioria tem entre 17 e 20 anos). Em algumas salas, nem a metade dos alunos frequenta diariamente, o que veio a prejudicar a pesquisa, pois muitos dos que estavam presentes no dia em que ela foi iniciada não apareceram na conclusão e outros nem quiseram participar.
Por conhecer a realidade dos meus alunos, vi que seria necessário uma explicação, nem que fosse mínima, sobre sintaxe para então iniciar a pesquisa, pois a maioria trabalha e não tem muito interesse nos estudos.
Na primeira aula, nas salas de segundo e terceiros anos, eu levei uma folha xerocada com todos os conceitos básicos de sintaxe e, no primeiro ano, utilizei o livro didático adotado pela escola, entretanto diversos motivos fizeram com que eu perdesse muitas aulas nas salas, como provas da escola, da subsecretária, reunião com os professores e eu também fiquei doente e não pude comparecer por uma semana, o que prolongou a pesquisa, mas, nas aula que eu podia ministrar, fazia explicações sobre os termos que estavam presente na folha ou no livro e então comprovei que a dificuldade dos alunos era imensa e muitos nem lembravam o que era tudo aquilo.Outros alunos, porém, estavam interessadíssimos em entender a matéria, trazendo livros didáticos que abordavam o assunto, participando de forma oral e principalmente fazendo as atividades propostas de maneira aplicada, colaborando de forma positivissíma para a pesquisa.
Após concluir a parte das explicações, selecionei algumas frases do livro que a Fernanda me emprestou e passei para que os alunos analisassem sintaticamente sem a minha orientação, a fim de saber o que eles tinham aprendido e o que podiam entender sobre elas. No final da aula de cada sala, recolhi as atividades e as corrigi. As frases usadas estão abaixo com os principais apontamentos que fiz de cada sala.
Elas são:
“Mandei-os entrar”.
“Deixaram-me sentar”.
“Mandei o menino assobiar, cantar e sorrir”.
No primeiro ano, somente uma aluna conseguiu encontrar os sujeitos de cada frase e poucos classificaram os pronomes oblíquos como sujeito. No geral, as análises foram bastante problemáticas, pois grande parte dos alunos não são muito interessados e não tentaram classificar todos os termos da oração, ou deram o mínimo de informações possíveis sobre as frases, e alguns copiaram dos demais colegas, outros classificaram “os” como advérbio, “me” como verbo, “sentar” como preposição e “menino” como substantivo.
Na turma do segundo ano não foi tão problemático, mas poucos alunos conseguiram identificar o sujeito  nas frases e a maioria classificou os pronomes oblíquos como sujeito, eles deram mais detalhes sintáticos sobre as frases, e muitos também copiaram.
Nos terceiros anos, os alunos entraram em desespero quando eu coloquei as frases no quadro. Diziam que não daria tempo, que não sabiam o que fazer, que a análise estava muito difícil de ser feita, que as frases não tinham lógica, que eu tinha que ajudar etc. No final, todavia, fizeram um bom trabalho, muitos identificaram o sujeito e a maioria classificou os pronomes oblíquos como sujeito e soube classificar o resto das frases, só tiveram alguns problemas, como, por exemplo, classificar “deixaram-me” como sujeito.


COMPARE AS AULAS DE PORTUGUÊS COM AS AULAS DE MATEMÁTICA E ESCREVA A SUA REFLEXÃO EM FORMA DE COMENTÁRIO:



Este artigo também está muito interessante, quase tão bom quanto o da Ivana: 

6 comentários:

  1. A respeito da pesquisa apresentada pela graduanda do curso Letras-Português Ivana Patricia com os seus alunos de Ensino Médio. Percebi o quanto o ensino básico deixa a desejar em aspectos simples e importantíssimos. Não que os problemas estejam somente na forma de passar os conteúdos, como também nos questionamentos dos alunos em enfrentar uma atividade como se fosse um bicho de sete cabeças. Os alunos mentalizam que é difícil e que não irão conseguir sem ao menos tentar identificar qual é a questão. Percebi que quando eles interessaram pela questão, consequentemente conseguiram resolve-la. O maior problema que encontrei nesses alunos pesquisados, e acredito que não são somente eles, é a falta de interesse em estudar para aprender, querem simplesmente realizar uma atividade, sem nem mesmo entender o que estão fazendo, para garantirem a nota e passarem de ano. O interesse de alguns não é aprender e sim passar de uma série para a outra sem reprovarem. Confesso que fiquei bastante chocada com a realidade do nosso ensino, onde, o aluno não sabe nem quem é o sujeito de uma frase. Precisamos mudar a história dos nossos alunos. E para que isso aconteça é preciso começar lá do Ensino Fundamental, para quando chegarem no Ensino Médio não depararem com tantas dificuldades.

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  2. Creio não ser simples falta de interesse por parte dos alunos, afinal para quê tenho que saber isso? é o que muitos alegam...não os julgo, eles têm o direito de saber porque "Mandei-os entrar". Entrar onde?com quem? passei parte da vida escolar com essas perguntas na cabeça..."Mandei o menino assobiar, cantar e sorrir" e mais uma vez a confusão. Isso porque a língua é viva e faz parte de quem a usa, a usamos antes de termos que dissecá-la, antes de dizer-nos porque a usamos de determinada maneira, e é no mínimo "decepcionante" descontextualiza-la para explicar seu funcionamento, é como ver um velho conhecido sendo apresentado de maneira diferente da que o conhecemos...

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  3. Olá, bom dia a todos!

    Gostaria apenas de tecer alguns comentários relacionados ao tema abordado pela aluna Ivana na pesquisa desenvolvida. Há algumas semanas quando se iniciou a pesquisa, confesso que poderia até apostar (conquanto eu acreditasse em outra análise) que a maioria dos alunos – ao observar a estrutura das frases supracitadas - conferiria aos pronomes oblíquos a função de objeto direto. Tal suposição foi feita em razão de os pronomes oblíquos exercerem – em maior frequência - a função de complemento verbal (mas não somente) – o que os torna mais produtivos linguisticamente no desempenho dessa função sintática. Ademais, o sintagma nominal com a função de sujeito – ao ser substituído por um pronome pessoal – passa a ser representado, prototipicamente, por pronome reto. Assim, imaginei que a análise feita pelos alunos ocorreria com base no que é mais comum, o que não foi ratificado pelas conclusões apontadas.

    Acontece que, até mesmo no ensino da gramática tradicional, a análise sintática das chamadas orações infinitivo-latinas (que foram utilizadas na pesquisa) gera divergências. A estrutura delas, geralmente, é a seguinte: verbo causativo ou verbo sensitivo + pronome oblíquo ou sintagma nominal + verbo no infinitivo. De acordo com Celso Cunha e Napoleão Mendes de Almeida, a análise delas ocorreria da seguinte forma:

    Deixaram-me entrar

    Deixaram: oração principal

    me entrar: objeto direto do verbo de Deixaram (trata-se, na verdade, de oração subordinada substantiva objetiva direta reduzida)

    me: sujeito de entrar

    Talvez a maior dificuldade nessa análise seja perceber que o objeto direto de Deixaram é toda a estrutura me entrar. Há, neste país, professores de gramática tradicional (e não são poucos) que chegam a afirmar que o pronome me sozinho seria, simultaneamente, o objeto de Deixaram e sujeito de entrar. Tal análise, a meu ver, seria inadequada, já que, ao se partir da oração desenvolvida, ficam claras as funções sintáticas desempenhadas por cada termo. Vejamos:

    Deixaram que eu entrasse (oração desenvolvida)

    Deixaram: oração principal

    que eu entrasse: objeto direto do verbo Deixaram (trata-se de oração subordinada substantiva objetiva direta desenvolvida)

    eu: sujeito

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  4. Na forma desenvolvida, verifica-se, com maior facilidade, que toda a oração que eu entrasse é o complemento direto de Deixaram e apenas eu é sujeito de entrasse. Assim, o que se pode afirmar é que o oblíquo, nesse caso, é sujeito de entrar/entrasse e faz parte do objeto de Deixaram , todavia não o constitui inteiramente.

    Agora, a pergunta é a seguinte: por que, nesse caso, ao se passar da oração desenvolvida para a reduzida, a gramática tradicional exige que se substitua o pronome reto por um oblíquo? Ou ainda: por que se usa, nesse caso, um oblíquo para exercer a função de sujeito, e não um pronome reto (que é o prototipicamente usado para tal função)? Bem, simplesmente porque a gramática tradicional resolveu manter, nessas orações, a estrutura latina. É que, como se sabe, o sujeito, no latim, vai para caso nominativo, exceto nas construções usadas na pesquisa (as chamadas, hoje, de orações infinitivo-latinas). Assim, na estrutura: verbo causativo ou verbo sensitivo + pronome oblíquo ou sintagma nominal + verbo no infinitivo, o sujeito, como vimos, seria o pronome oblíquo ou o sintagma nominal (análise que fica mais fácil de ser identificada se se partir da oração desenvolvida). No latim, contudo, o sujeito – excepcionalmente nesse tipo de construção - não ia para o nominativo, mas para o acusativo – que, se fosse representado por pronome pessoal, seria oblíquo, e não reto.

    Bem, é claro que nem sempre é possível se basear no latim para analisar a língua portuguesa, sobretudo porque muitas estruturas já foram perdidas. É perceptível que, no uso cotidiano, o falante, em geral, usa o pronome reto nessas orações e com razão, já que o reto é tipicamente sujeito.

    Depois de ler o resultado da pesquisa e de conversar pessoalmente com a Ivana, fiquei com algumas indagações que gostaria de compartilhar: será que os alunos que classificaram os oblíquos como sujeito realmente o fizeram conscientemente ou fizeram sem muita reflexão? Será que o possível fato de eles não terem o pressuposto de que o oblíquo geralmente é complemento teria facilitado a análise? Imagino também que o fato de eles possivelmente não terem procurado identificar o objeto do verbo causativo ou do verbo sensitivo fez com que não houvesse muitas dúvidas, como: “o oblíquo é objeto ou é sujeito?” e “o oblíquo é ao mesmo tempo sujeito e objeto?” Bem, fiz apenas algumas suposições. O que vocês pensam a respeito?

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    Respostas
    1. São brilhantes as sus análises e as suas suposições. Eu não tenho experiência com alunos da educação básica, então, vou tecer comentários com base nas intuições dos falantes em geral e não apenas dos alunos com o perfil pesquisado. Os falantes usam pronomes oblíquos com a função de sujeito, a fronteira e as funções dos pronomes pessoais, oblíquos e retos, não são realidades para os falantes, como é para o linguista e o professor de português. Em estruturas com dois verbos - "deixaram - me - sair", é mais provável que o falante perceba/reconheça/identifique o sujeito ("aquele que pratica a ação") diante de um verbo do que o objeto complementar do verbo. A categoria "nome" com função de "sujeito" é mais realidade para o falante do que a categoria "nome" com a função de objeto. Talvez seja isso, não sei.
      Enfim, Fernanda, eu acredito que os alunos classificaram o pronome oblíquo como sujeito com a consciência linguística do falante e não com a consciência metalinguística do estudante de português.
      Essas suposições merecem uma pesquisa mais sistemáticas para que tenhamos segurança nos resultados, sem dúvida.

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  5. Está mantido o desafio, Ivana, Jeane, Helenice e Fernanda: COMPAREM AS AULAS DE PORTUGUÊS COM AS AULAS DE MATEMÁTICA (VIDE CATUNS) E ESCREVAM A SUA REFLEXÃO EM FORMA DE COMENTÁRIO.

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